Fórum de Reflexão Económica e Social

«Se não interviermos e desistirmos, falhamos»

terça-feira, maio 19, 2015

Violência ou coexistência pacífica?



Como é do conhecimento geral, a educação é um factor fundamental na formação dos jovens de hoje para que estes se tornem adultos responsáveis amanhã, com respeito por si e pelos outros,  pelas normas e valores da sociedade onde estão inseridos.
É extremamente importante que haja a preocupação da sociedade, e com mais ênfase entre os eleitos, para dirigirem a vida das pessoas, no sentido de promoverem e serem um exemplo do respeito pelas normas e valores sociais, cuja responsabilidade, entre outras, passa também pela elaboração de legislação e sanções que permitam que os cidadãos possam viver sem mêdo na sociedade. Esta é uma das razões da necessidade da existência de normas que regulem os comportamentos sociais. Na ausência destas, impera a lei do salve-se quem puder, onde o mais fraco fica em situação desprotegida. Não sei se é este o modelo que está em curso, mas atentemos a certos acontecimentos que se vêm tornando banais na nossa sociedade, ilustrados, a título de exemplo, pelas seguintes notícias:

“Um adolescente de 14 anos que estava desaparecido desde domingo foi encontrado morto na madrugada desta quinta-feira dentro da arrecadação de um prédio ... O jornal avança ainda que o jovem terá sido morto à pancada na sequência de um conflito com outros adolescentes”

“As imagens colocadas na internet ... mostram um jovem a ser agredido durante mais de dez minutos ...” 

“Um rapaz de doze anos foi agredido dentro de um autocarro escolar ... deram-lhe socos e murros ... o motorista do autocarro apenas  ordenou aos agressores que limpassem o rapaz com água ... o jovem de doze anos saiu então numa paragem de autocarro ... e dois ou três passos depois desmaiou ...”

O que verificámos? Jovens em idade de formação, cujo comportamento, a continuarem assim, não augura adultos socialmente responsáveis.

Contudo, é necessário que nos debrucemos sobre os porquês destes comportamentos, pois como sabemos podemos considerar a estruturação do comportamento como sendo uma função da Pessoa, enquanto portadora de toda uma carga hereditária, com mais ou menos propensão para evidenciar determinadas características e do Meio Social, enquanto transmissor de normas e valores da sociedade, convencionadas, para que os seus elementos possam ter uma coexistência pacífica, com respeito pelos seus direitos e pelos direitos dos outros.

E é sobre este último factor que gostaria de chamar a atenção. Efectivamente, desde que nasce, o indivíduo fica dependente da sociedade, em primeiro lugar no seio familiar que o alimenta e proporciona a satisfação de todas as necessidades básicas para  a sua sobrevivência. É também aqui que lhe são dadas a conhecer as primeiras regras e normas de convivência social, onde os pais os vão preparando para o mundo exterior. Por outro lado, a experiência com as primeiras relações fora do círculo familiar acontece através dos contactos de vizinhança, permitindo percepcionar que existem outros membros na sociedade, para além da família, e que implica comportamentos diferentes. A fase seguinte, provavelmente uma das mais importantes da sua formação, tem a ver com a sua integração na escola, local onde terá uma figura de autoridade social, o professor, que, naquele local, desempenha não só o papel de facilitador da aprendizagem de matérias e ferramentas necessárias para o seu desenvolvimento sócio-profissional futuro, como a figura parental, enquanto transmissor de normas e valores necessários à sua interacção social.

Chegados aqui, a pergunta que se impõe, para entendermos o sucedido nos exemplos acima descritos de comportamentos violentos entre os jovens, é o que falhou na educação e formação daqueles jovens?

Falhou desde logo, e muito provavelmente, o acompanhamento dos pais, em casa e em sociedade, não lhes proporcionando uma adequada interiorização das normas e valores de convivência e respeito pelos outros. Os motivos desta falha poderão ser de natureza diversificada, desde o deixa andar dos pais abandonando-os à sua sorte, relacionando-se com outros elementos que não a família, facilitando a desestruturação familiar, justificando, os pais, a sua atitude com o cansaço ou falta de tempo originado pelo trabalho, a necessidade de gerir o seu tempo de acordo com os seus gostos e necessidades pessoais, o mau relacionamento ou a manutenção de uma relação de casamento indesejada, mas consentida por razões económicas, ou quiçá a continuação de comportamentos adquiridos na sua própria formação e desenvolvimento pessoal.
Como sabemos os jovens tendem a reproduzir os comportamentos vivenciados nos seus círculos familiares e, se os exemplos são de violência doméstica, sejam de natureza física ou psicológica, para eles são os comportamentos adequados, os que apreenderam, os que conhecem para se relacionarem com os outros. Claro que os pais não lhes dizem para se comportarem assim, e ficam admirados se lhes dizem que são os principais responsáveis, mas que exemplos de comportamentos eles lhes forneceram para se relacionarem? Que outros conhecem? É aqui que alguns pais, para se desvincularem da educação dos filhos, atribuem responsabilidade à escola, aos professores que não cumprem o seu papel de educadores. Mas, que pensará um jovem, quando o professor lhe transmite regras e valores de relacionamento e respeito na interacção social e chega a casa e vê o contrário? Quem está certo? O professor ou os pais? Quem são os seus heróis? Com quem habitam? 
Obviamente os pais, e todo o esforço do professor cai por terra. Por outro lado, a confusão instala-se na cabeça dos jovens e a estruturação da sua personalidade, que se deseja adequada à sociedade onde terá de viver, fica deficitária. E mais  preocupante é ainda ouvir certos pais dizerem “não entendo o seu comportamento, eu farto-me de lhe dar porrada e ele não aprende, já não sei o que fazer mais”
Não precisa, já fez, quer pelo tempo em que o deixou sem acompanhamento e o formou desse modo, quer pelo comportamento violento “dar porrada” que faz com que o jovem, quando não concorde com alguém no seu relacionamento, ou quando contrariado, imite os pais e resolva tudo à porrada.

Efectivamente parece urgente repensar não só o papel da escola na formação dos jovens, como chamar à responsabilidade os pais, talvez organizando acções de sensibilização, com o peso e autoridade que os governos têm, obrigando-os, nos casos complicados e se não houver outra forma de os convencer, a frequentarem acções de formação comportamental.
Por sua vez, e em complementaridade, os jovens teriam ao seu dispôr, também acções de formação comportamental, no âmbito da escola, alargadas a todos os alunos, talvez no formato de uma  disciplina curricular obrigatória, não só para combater estes excessos de violência, como também para os consciencializarem dos exemplos desajustados, como por exemplo, os proporcionados nos filmes e séries televisivas de acção, que podem tornar-se num convite à reprodução de comportamentos violentos, para se identificarem com os pseudo heróis da tela e, se dúvidas houver, é só assistir às conversas entre jovens a comentarem os feitos, as cenas de pancadaria, os golpes, as habilidades de violência exibidas pelos diversos personagens.

De facto, e segundo parece, certo tipo de medidas, como a noticiada em Outubro de 2010 por um jornal diário e que informava : “Universidade ... ensina a gerir a indisciplina, docentes aprendem técnicas marciais. Curso vai ensinar 225 docentes a controlarem melhor a violência nas salas de aulas”, não serão a solução para esta questão.

Efectivamente, como sabemos, comportamento gera comportamento e, nesse sentido, violência gera violência. Talvez que o melhor caminho em vez de se ensinar a gerir a indisciplina através da violência, seja o de se  ensinar a controlar e gerir as emoções, no sentido de evitar o conflito.

Foto: José A Ferreira Alves