Fórum de Reflexão Económica e Social

«Se não interviermos e desistirmos, falhamos»

sexta-feira, julho 17, 2015

Lançamento do Livro "Agora é que é" - Guilherme Amoroso Romão

 

Caros Amigos
 

Informamos os leitores do Blogue do FRES que temos mais um feliz evento a anunciar e que temos mais um amigo a publicar um Livro.
 
Desta feita queremos anunciar o lançamento do livro de Guilherme Amoroso Romão (filho do nosso estimado fresiano Mário Romão), a editar pela Chiado Editora - coleção "Viagens na Ficção", evento que ocorrerá a 12 de Setembro às 16h, na livraria Desassossego em Lisboa.
 
Será um enorme prazer poder contar com a presença neste evento de todos os nossos queridos amigos, membros, visitantes, seguidores e outros acompanhantes do FRES.
Evento no Facebook, com link abaixo:
 
Sábado, 12 de Setembro às 16:00
 
Saudações fresianas

 

quarta-feira, julho 01, 2015

Divagações sobre a crise da Grécia



Em 2010, a crise instalada abalou as economias, gerando os PIGS (Portugal, Irlanda, Grécia, Espanha). No início do sec. XX, gerou-se o Darwinismo Social, posteriormente aplicado aos países: as economias mais fortes sobrepunham-se às fracas - sugerindo que os países que estavam pobres eram os menos aptos e deviam submeter-se aos mais fortes.

Em 2014, a Crimeia foi causa de divergências bélicas entre a Rússia e a Ucrânia. Em 1914, a França e a Alemanha estavam também belicamente mal dispostas por causa da Alsácia-Lorena.

Em 2015, os refugiados africanos, a fugir da pobreza, tornam-se de súbito visíveis. Em 1914, a revolução industrial tinha gerado bolsas de pobreza que provocaram vagas migratórias da Irlanda e da Inglaterra para os Estados Unidos. Também da pouco industrializada e muito rural Itália, saiu uma percentagem significativa da população.

Em 2015, a Europa "acordou" para o problema da radicalização das minorias e o impensável acontecia: execuções e atentados. Em 1914, Turcos, Austríacos, Sérvios, Russos, Ingleses, Franceses e Alemães radicalizavam os respectivos nacionalismos.

etc.&tal...

Em 1914, 2 tiros em Sarajevo foram o rastilho de uma guerra.
Em 2015, parece que o barril está cheio de pólvora, não sabemos é se os tiros já foram disparados.
Esperemos que os actuais governantes tenham aprendido algo com a História.

Ana Nobre

segunda-feira, junho 15, 2015

A Educação perdeu o estatuto de um direito e ganhou o estatuto de uma mercadoria



Santana Castilho *

Não conseguiremos, sós, à revelia da Europa em que nos integramos, particularmente sem cumplicidade política estabelecida com os países cujos problemas se assemelham aos nossos, mudar a maior parte das variáveis que condicionam a nossa vida futura. Mas podemos mudar a Educação. Se queremos mudar Portugal, temos que dar atenção à Educação e alterar-lhe o rumo. Cada vez instruímos mais (e em sentido errado) e educamos menos. Em nome de uma economia sem humanidade, construímos autómatos e roubamos a infância às nossas crianças. Em período de pré campanha, o que se vê (ou não se vê) é desolador.

1. A acusação é grave e não pode passar sem que o ministro da Educação e Ciência se pronuncie sobre a matéria. De forma clara e rápida. Um grupo de cidadãos, mães e pais, afirmam em documento, que tornaram público, que uma organização, a Associação Junior Achievement Portugal, sucursal de congénere norte-americana, anda a “doutrinar crianças desde o 1º ano de escolaridade a … ver a família como unidade de consumo e produção, naturalmente dependente de empresas privadas … inculcando a obsessão pelo sucesso assente na lógica da competição”. Tudo se passa em tempo normal de aulas, sob responsabilidade de voluntários estranhos às escolas mas com a conivência das autoridades, designadamente autarquias locais, e sem qualquer tipo de consulta aos pais e, muito menos, a sua autorização. No documento em análise, os pais referem haver uma recomendação expressa para que os formadores voluntários sejam recrutados no meio empresarial e as crianças se venham a identificar “com a figura do voluntário no final da formação”. O programa, afirmam, “está orientado de uma forma que, cremos, exerce uma violência simbólica sobre crianças e adolescentes, escondendo por detrás de uma ou outra informação ética superficial uma manipulação de consciências no sentido de identificar o ser humano da sociedade contemporânea como exclusivamente orientado para o mercado, o consumo e o lucro, sem que a interacção com outros seres humanos sirva outro fim que não esse. Competição, individualismo, afirmação individual, ambição pessoal e agressividade são os valores que se promovem”.
O ministro não se pode esconder atrás da falsa autonomia das escolas para nada dizer sobre esta acusação. Doutrinar crianças à revelia dos pais e dos programas vigentes, apresentando-lhes a dignidade humana como simples corolário do mercado, é um “empreendedorismo social” que não pode ser tolerado na escola pública.

2. O até agora inimputável José Alberto Duarte (são várias as trapalhadas por que tem passado incólume), director-geral dos Estabelecimentos Escolares, é visado e considerado responsável por uma irregularidade grave detectada numa auditoria do Tribunal de Contas. Trata-se de uma contratação de serviços de fornecimento de refeições a escolas, no valor de 3,5 milhões de euros, alegadamente operada sem cobertura legal. Segundo o Correio da Manhã, que denunciou a situação, o Tribunal de Contas remeteu as conclusões da auditoria para o Ministério Público, referindo que “a gravidade do incumprimento desaconselha a relevação da responsabilidade”. Quem sabe se este servidor público, antes de servir a grei, não terá sido voluntário da Associação Junior Achievement Portugal e a questão não se possa resolver, a bem do mercado, com a extensão da redentora pedagogia aos senhores juízes do Tribunal de Contas.

3. Num debate recente que travei no programa Política Mesmo, na TVI 24, com o presidente do IAVE, aludi a erros inaceitáveis em matéria de exames. Respondeu-me que esses erros representavam 0,01% dos 30.000 itens que o IAVE havia produzido. Não sei quantos itens inúteis o IAVE produziu. Sei que há mentiras piedosas, mentiras abjectas e … estatística. E sei que os estudantes surdos do 9º ano, obrigados a sujeitarem-se ao Preliminary English Test for Schools (PET), prova secreta de inglês (assim a classifico porque o conhecimento público do respectivo conteúdo está rigorosamente proibido), concebida por uma instituição estrangeira e financiada por processo que está a ser investigado pela Polícia Judiciária, foram impedidos de cumprir parte dela por erro, incompetência e desprezo do IAVE. O independente IAVE, servo da política numeralista do ministro, preparou um CD para que surdos profundos “ouvissem” o que, por razões óbvias, não podem ouvir. Esta lamentável circunstância não beliscará a expressão estatística que enche de orgulho o presidente do IAVE. Mas mais que um erro ridículo, absolutamente inaceitável, expõe a face desumana de uma política. Pela mão deste Governo e do seu ministro Nuno Crato, a Educação perdeu o estatuto de um direito e ganhou o estatuto de uma mercadoria. Cem estudantes surdos profundos não contam para estes desalmados, manipule o IAVE as estatísticas como lhe aprouver.


* Professor do ensino superior (s.castilho@netcabo.pt

quarta-feira, junho 10, 2015

Seminário: Educar para o Futuro. Qual o modelo de ensino para as novas gerações?



Sábado 20 de Junho – 15 horas

ISEG - Lisbon School of Economics & Management - Universidade de Lisboa
(Rua do Quelhas 1200-781 Lisboa)


Seminário: Educar para o Futuro. Qual o modelo de ensino para as novas gerações?


Programa

14h45 – Receção dos participantes

15h00 – Abertura da sessão e boas vindas pelo ISEG
(Mário Romão – Professor do ISEG)

15h05 – Introdução do Seminário e razões para o debate
(Mário de Jesus – Presidente da direção do FRES)

A. A educação e o ensino em Portugal

15h15

i) O Ensino de hoje responde às necessidades reais do país e pode ser visto como a alavanca do desenvolvimento socioeconómico nacional?

ii) Como garantir uma melhor qualidade do ensino?
(Santana Castilho – Professor Universitário e coordenador do curso de Organização e Gestão do Ensino na Escola Superior de Educação de Santarém)

15h45 - iii) Qual a melhor articulação para a coexistência do Ensino Público com o Ensino Privado?
(Fernando Adão da Fonseca – Gestor e Presidente do FLE – Fórum para a Liberdade de Educação)

16h15 – Debate

17h – Intervalo para café

17h15 - iv) Como pode o Ensino preparar os alunos para novas aptidões e competências?
(Luís Rodrigues – Professor do Ensino Secundário, ex-Diretor do Agrupamento de Escolas do Ensino Básico e Secundário Pedro Santarém em Lisboa, ex-deputado à AR pelo distrito de Beja)

17h45 - v) Qual o papel da escola e do professor?
(Pedro Fernandes da Anunciação – Professor coordenador e Presidente do Conselho Científico da Escola Superior de Ciências Empresariais do Instituto Politécnico de Setúbal)


B. Os aspetos demográficos no Sistema de Ensino

18h15

i) Impacto a longo prazo da taxa de natalidade na população escolar e na escola do futuro e da demografia no futuro modelo do Ensino em Portugal.

ii) A desertificação demográfica do interior e os desequilíbrios geográficos gerados no país - impacto na afetação dos recursos escolares.
(Pedro Góis – Professor Universitário, Doutorado em Sociologia, Investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra)

18h45 – Debate

19h15 – Encerramento da sessão

terça-feira, maio 19, 2015

Violência ou coexistência pacífica?



Como é do conhecimento geral, a educação é um factor fundamental na formação dos jovens de hoje para que estes se tornem adultos responsáveis amanhã, com respeito por si e pelos outros,  pelas normas e valores da sociedade onde estão inseridos.
É extremamente importante que haja a preocupação da sociedade, e com mais ênfase entre os eleitos, para dirigirem a vida das pessoas, no sentido de promoverem e serem um exemplo do respeito pelas normas e valores sociais, cuja responsabilidade, entre outras, passa também pela elaboração de legislação e sanções que permitam que os cidadãos possam viver sem mêdo na sociedade. Esta é uma das razões da necessidade da existência de normas que regulem os comportamentos sociais. Na ausência destas, impera a lei do salve-se quem puder, onde o mais fraco fica em situação desprotegida. Não sei se é este o modelo que está em curso, mas atentemos a certos acontecimentos que se vêm tornando banais na nossa sociedade, ilustrados, a título de exemplo, pelas seguintes notícias:

“Um adolescente de 14 anos que estava desaparecido desde domingo foi encontrado morto na madrugada desta quinta-feira dentro da arrecadação de um prédio ... O jornal avança ainda que o jovem terá sido morto à pancada na sequência de um conflito com outros adolescentes”

“As imagens colocadas na internet ... mostram um jovem a ser agredido durante mais de dez minutos ...” 

“Um rapaz de doze anos foi agredido dentro de um autocarro escolar ... deram-lhe socos e murros ... o motorista do autocarro apenas  ordenou aos agressores que limpassem o rapaz com água ... o jovem de doze anos saiu então numa paragem de autocarro ... e dois ou três passos depois desmaiou ...”

O que verificámos? Jovens em idade de formação, cujo comportamento, a continuarem assim, não augura adultos socialmente responsáveis.

Contudo, é necessário que nos debrucemos sobre os porquês destes comportamentos, pois como sabemos podemos considerar a estruturação do comportamento como sendo uma função da Pessoa, enquanto portadora de toda uma carga hereditária, com mais ou menos propensão para evidenciar determinadas características e do Meio Social, enquanto transmissor de normas e valores da sociedade, convencionadas, para que os seus elementos possam ter uma coexistência pacífica, com respeito pelos seus direitos e pelos direitos dos outros.

E é sobre este último factor que gostaria de chamar a atenção. Efectivamente, desde que nasce, o indivíduo fica dependente da sociedade, em primeiro lugar no seio familiar que o alimenta e proporciona a satisfação de todas as necessidades básicas para  a sua sobrevivência. É também aqui que lhe são dadas a conhecer as primeiras regras e normas de convivência social, onde os pais os vão preparando para o mundo exterior. Por outro lado, a experiência com as primeiras relações fora do círculo familiar acontece através dos contactos de vizinhança, permitindo percepcionar que existem outros membros na sociedade, para além da família, e que implica comportamentos diferentes. A fase seguinte, provavelmente uma das mais importantes da sua formação, tem a ver com a sua integração na escola, local onde terá uma figura de autoridade social, o professor, que, naquele local, desempenha não só o papel de facilitador da aprendizagem de matérias e ferramentas necessárias para o seu desenvolvimento sócio-profissional futuro, como a figura parental, enquanto transmissor de normas e valores necessários à sua interacção social.

Chegados aqui, a pergunta que se impõe, para entendermos o sucedido nos exemplos acima descritos de comportamentos violentos entre os jovens, é o que falhou na educação e formação daqueles jovens?

Falhou desde logo, e muito provavelmente, o acompanhamento dos pais, em casa e em sociedade, não lhes proporcionando uma adequada interiorização das normas e valores de convivência e respeito pelos outros. Os motivos desta falha poderão ser de natureza diversificada, desde o deixa andar dos pais abandonando-os à sua sorte, relacionando-se com outros elementos que não a família, facilitando a desestruturação familiar, justificando, os pais, a sua atitude com o cansaço ou falta de tempo originado pelo trabalho, a necessidade de gerir o seu tempo de acordo com os seus gostos e necessidades pessoais, o mau relacionamento ou a manutenção de uma relação de casamento indesejada, mas consentida por razões económicas, ou quiçá a continuação de comportamentos adquiridos na sua própria formação e desenvolvimento pessoal.
Como sabemos os jovens tendem a reproduzir os comportamentos vivenciados nos seus círculos familiares e, se os exemplos são de violência doméstica, sejam de natureza física ou psicológica, para eles são os comportamentos adequados, os que apreenderam, os que conhecem para se relacionarem com os outros. Claro que os pais não lhes dizem para se comportarem assim, e ficam admirados se lhes dizem que são os principais responsáveis, mas que exemplos de comportamentos eles lhes forneceram para se relacionarem? Que outros conhecem? É aqui que alguns pais, para se desvincularem da educação dos filhos, atribuem responsabilidade à escola, aos professores que não cumprem o seu papel de educadores. Mas, que pensará um jovem, quando o professor lhe transmite regras e valores de relacionamento e respeito na interacção social e chega a casa e vê o contrário? Quem está certo? O professor ou os pais? Quem são os seus heróis? Com quem habitam? 
Obviamente os pais, e todo o esforço do professor cai por terra. Por outro lado, a confusão instala-se na cabeça dos jovens e a estruturação da sua personalidade, que se deseja adequada à sociedade onde terá de viver, fica deficitária. E mais  preocupante é ainda ouvir certos pais dizerem “não entendo o seu comportamento, eu farto-me de lhe dar porrada e ele não aprende, já não sei o que fazer mais”
Não precisa, já fez, quer pelo tempo em que o deixou sem acompanhamento e o formou desse modo, quer pelo comportamento violento “dar porrada” que faz com que o jovem, quando não concorde com alguém no seu relacionamento, ou quando contrariado, imite os pais e resolva tudo à porrada.

Efectivamente parece urgente repensar não só o papel da escola na formação dos jovens, como chamar à responsabilidade os pais, talvez organizando acções de sensibilização, com o peso e autoridade que os governos têm, obrigando-os, nos casos complicados e se não houver outra forma de os convencer, a frequentarem acções de formação comportamental.
Por sua vez, e em complementaridade, os jovens teriam ao seu dispôr, também acções de formação comportamental, no âmbito da escola, alargadas a todos os alunos, talvez no formato de uma  disciplina curricular obrigatória, não só para combater estes excessos de violência, como também para os consciencializarem dos exemplos desajustados, como por exemplo, os proporcionados nos filmes e séries televisivas de acção, que podem tornar-se num convite à reprodução de comportamentos violentos, para se identificarem com os pseudo heróis da tela e, se dúvidas houver, é só assistir às conversas entre jovens a comentarem os feitos, as cenas de pancadaria, os golpes, as habilidades de violência exibidas pelos diversos personagens.

De facto, e segundo parece, certo tipo de medidas, como a noticiada em Outubro de 2010 por um jornal diário e que informava : “Universidade ... ensina a gerir a indisciplina, docentes aprendem técnicas marciais. Curso vai ensinar 225 docentes a controlarem melhor a violência nas salas de aulas”, não serão a solução para esta questão.

Efectivamente, como sabemos, comportamento gera comportamento e, nesse sentido, violência gera violência. Talvez que o melhor caminho em vez de se ensinar a gerir a indisciplina através da violência, seja o de se  ensinar a controlar e gerir as emoções, no sentido de evitar o conflito.

Foto: José A Ferreira Alves

quarta-feira, abril 08, 2015

O valor da Política e a Política com valor


A política é uma das mais nobres atividades do ser humano. Tudo o que discutimos é política e são política todas as nossas ações, reflexões e iniciativas. A política tem uma vastidão de braços com uma mão no fim e que nos abraça em todas as nossas manifestações humanas e enquanto seres sociais: a política da educação, a política social, a política da justiça, a política do emprego, a política monetária ou financeira, a política diplomática etc.

Por isso é hoje mais do que nunca relevante valorizar a política como nobre atividade que é. Embora encontremos níveis de compadrio, corrupção, clientelismo e também de nepotismo, a verdade é que, por tradição, alguns povos do norte da Europa olham para a política de uma forma diferente. Sem esquecer os aspetos atrás referidos pois sabemos que existem sempre exceções, a política é vista em países como a Finlândia, a Dinamarca, a Noruega ou a Suécia (são apenas uns exemplos) como uma missão, uma responsabilidade, um desiderato, cujos valores estão acima de tudo e para a qual, quer cidadãos quer políticos, devem contribuir, na qual todos têm que se envolver e sobre a qual devem assumir a maior respeitabilidade. Devia ser assim por aqui. O pior da política são os (alguns) políticos.

Deixou de ser uma ideia feita ou um preconceito, fazendo referência ao excelente artigo do meu amigo José Ferreira Alves, a tese de que "cada povo tem os políticos que merece". Passou já de um preconceito à realidade; de facto, cada povo tem os políticos que merece. Porque há os bons e há os maus e os maus, só lá estão porque o povo (os povos) o permitiram, por desleixo, desinteresse, por irresponsabilidade ou descomprometimento. Em suma, por culpa própria.

E temos hoje infelizmente exemplos de sobra sobre a fraqueza da nossa política. Não ao nível dos partidos. Estes são o que são, existem porque existem, são estes mas podiam ser outros, pelo que, se os cidadãos não se revêm nestes partidos, terão duas possibilidades de atuar: ou criam novos partidos ou entram nestes e apresentam propostas de mudança por dentro. Isto não se faz por uma só pessoa mas através de movimentos de muitas pessoas. Não é fácil, os resultados não são imediatos mas Roma e Pavia não se fizeram num só dia.

Os maus exemplos da política são os do dia a dia, quando se penhoram gaiolas de pássaros, aquários, unidades de fruta ou se despejam pessoas das suas casas por deverem ao Fisco um IMI de umas centenas de Euros. Esta é a política imunda, antissocial, antidemocrática que nos deve enojar e desejar a mudança. Esta é a política dos maus políticos. E o pior da política vem igualmente quando se perdem horas, dias, semanas de horário nobre nas TV´s e de resmas de páginas nos jornais diários , a discutir quem tem o melhor perfil para vir a ser um Presidente, como se o país não tivesse outros problemas a resolver. Quando não há emprego, quando não há cultura ou quando não há a justiça suficiente, para dar apenas uns parcos exemplos. Os cidadãos merecem que a política e os políticos os tratem com dignidade pelo que não podemos aceitar o que hoje se nos depara como a ditadura das finanças. Nem tudo se explica através de orçamentos e de contas de deve e haver, embora todos devamos saber fazer as contas do deve e haver.

Li há dias que o primeiro ministro do Japão pedia aumentos de salários às empresas e comparei com o que temos por cá. O Fisco pilha os cidadãos e a ameaça de novos impostos não está afastada até porque a fragilidade das finanças públicas e deste frágil equilíbrio orçamental, que pode ser perene, são como uma espécie de guilhotina sobre as nossas cabeças já que o fio que nos separa de uma crise é imensamente ténue. E tudo isto se passa à porta de eleições daqui a meses. Enquanto se discutem gaiolas, aquários e peças de fruta penhoradas ou o perfil do candidato a Belém, como se fosse este o gestor dos destinos do futuro, não se discutem as políticas da saúde, da educação, da justiça, do emprego ou da demografia.

No FRES discutimos política, falamos de política e agimos em prol da política. No FRES fazemos também política já que o livro que recentemente publicámos, espelha as nossas ideias de política: sobre a educação, sobre a demografia ou sobre a lei eleitoral, para dar apenas uns exemplos. Seria bom que as pessoas no geral e outros grupos em particular também se preocupassem e se ocupassem da política, para erradicar os piores políticos e ajudar a implementar melhores políticas. Assim como quem não tem medo, vergonha ou acanhamento em dar a cara por uma atividade tão nobre, afinal a mais nobre de todas, que é a política. 


terça-feira, abril 07, 2015

Preconceitos e Ideias Feitas ou o medo da mudança?



















Como nota introdutória deste texto, gostaria de clarificar que não se trata de uma crítica aos outros, mas de uma reflexão, enquanto cidadão e, de certo modo, uma auto crítica que, se porventura servir para ajudar outros a reflectirem sobre estas questões, deixar-me-á satisfeito e com o sentimento de ter dado o meu contributo.
Tão pouco é uma critica à mudança social operada em 1974, que tive o privilégio de presenciar e de colaborar enquanto militar e que nos trouxe importantes alterações sociais. Todavia, passados cerca de 40 anos sobre o evento, temos o direito e o dever de reflectir sobre a sua evolução que, como tudo na vida, tem pontos positivos e negativos.

No nosso dia a dia somos confrontados com opiniões sobre diversas situações e, sem nos darmos conta, ajuizamos muitas vezes com base em preconceitos, juízos previamente interiorizados, transmitidos e apreendidos através do nosso envolvimento social ou em ideias feitas, ideias formadas através da frequência de determinados eventos que a sociedade tende a generalizar e assumir como verdade. Porém, estes juízos falham pela falta de racionalidade, pela falta de argumentação sólida para justificar uma opinião, mais sustentados pelo diz que disse social e que tendem a ficar e a serem assumidos como uma realidade provada sem provas.

No primeiro caso temos assunções do tipo a homossexualidade é uma doença ou o lugar da mulher é em casa a cuidar dos filhos ou ainda os brancos são superiores às outras raças, admitindo sem necessidade de provar o que quer que seja, porque é a verdade e toda a gente sabe que é assim, porque sempre foi assim.

No segundo caso podemos encontrar atitudes tipo as mulheres conduzem pior que os homens ou sempre houve ricos e pobres como uma forma de justificar o injustificável, através de generalizações superficiais definindo certos estereótipos, cuja justificação se assemelha às respostas dadas às crianças na idade dos porquês, quando colocam questões mais ou menos incómodas aos pais e estes se limitam a responder-lhes porque sim e não se fala mais nisso.

Com este tipo de raciocínio, facilmente generalizamos, por exemplo, que os pobres são pouco cultos e têm fracas aptidões intelectuais ou que a mulher é o sexo fraco.

Lembro-me de quando tinha 15 anos, no antigo 6º ano liceal, actual 10º ano e se tinha a disciplina de Filosofia, foi permitido aos alunos questionarem sobre a realidade e as suas verdades e numa aula, obrigatória à época, de Religião e Moral, quando questionado sobre Deus e as suas (im)perfeições, o padre responsável pela disciplina, em resposta às dúvidas colocadas disse que compreender Deus é algo transcendente e está fora das capacidades do homem. Pois, é assim quando não se tem argumentos para justificar as nossas atitudes.

Tanspondo para a nossa vida quotidiana e concretamente para a política, o que se assemelha às atitudes acima descritas?

Haverá um preconceito ou ideia feita, criados por determinados partidos políticos, na qual só alguns têm competência para governar? Os outros são incompetentes, não têm experiência nem capacidade, só criticam e nada sabem fazer, porquê? Porque para aqueles partidos é conveniente, porque assim mantêm o seu estatuto de privilégio e é por estas e por outras que desde 1974 temos tido alternância, sem alternativa, sempre os mesmos a governar, ora uns ora outros, e os resultados práticos estão à vista. Insatisfação popular, exemplos atrás de exemplos de corrupção, de compadrio, de (des)governo em proveito próprio e a pobreza a aumentar. Afinal que tipo de competências nos apresentaram aqueles partidos? Que capacidades e conhecimentos nos demonstraram? Que mais valias trouxeram para a nossa vida? Faz-me recordar um estória que a minha avó contava sobre os avarentos e vigaristas, em que estes, quando se tratava de dividir com os outros os rendimentos obtidos, no tempo em que o dinheiro era patacas o faziam deste modo: pataca a mim, a mim pataca, pataca a ti. E, pelos vistos, a história repete-se.

E quando nos aproximamos das eleições lá vem o aviso, cuidado com os partidos fora do arco da governação, vão-nos afundar, vamos perder tudo, vamos ficar mais pobres, só sabem criticar, não têm competência nem experiência governativa. Mesmo sem sequer terem como o comprovar, emitem-se juízos à priori, sem fundamento lógico, apenas sustentados pelo receio de perderem o protagonismo, é a lógica do papão, como se ainda fossemos crianças, remetidas para o mundo dos fantasmas.

Claro que convém reafirmar o medo, os argumentos não mudaram, são, de certo modo, os mesmos do Estado Novo, a ameaça, agora não da prisão, mas do desemprego, da miséria, como se não houvesse desemprego e miséria a olhos vistos. O Povo português viveu sob o medo, acomodou-se e ficou algo apático até 1974. Acordou, reclamou, exigiu nem sempre bem, mas não se calou, e agora, o que difere do antigamente? Ah, pode-se falar, pode-se reclamar sem se ser preso, e depois? Depois, fica-se na lista das dispensas, dos excedentários, independentemente das suas competências, apenas porque se atreveu a falar, é uma outra forma de exclusão. O Povo português regrediu aos anos do Estado Novo, está apático, não reclama, tem medo, emigra, acentuando a tendência para sermos uma Nação cada vez mais pequena. Mesmo assim, alguns governantes, têm o despudor de falar sobre o problema da demografia como uma preocupação central a resolver, mas o que acontece a uma mulher que engravida? Tem o emprego garantido? Tem a sua vida profissional assegurada? Tem apoios na educação dos filhos? Ou há sugestões dissimuladas para se admitirem homens de preferência? Porquê? Porque não têm baixa de parto, porque não amamentam, porque em caso de doença são geralmente as mães que faltam para prestar apoio aos filhos. Porém, não faltam os defensores da maternidade, prometem leis, prometem sanções, tudo isto quando estão noutra dimensão da realidade, mas o que acontece no dia a dia nas empresas onde esses mesmos defensores têm cargos de decisão? Era interessante verificar.

E se face ao descontentamento o povo reclama que são necessários novos políticos com novas políticas, novos partidos alternativos, o que dizem os defensores do actual sistema? Partidos alternativos, tipo Syrisa Grego?  Deus nos livre, é o desastre, é a morte da democracia. Mas qual democracia? A de poder falar mesmo sem se ter o que comer? A de exigir menos austeridade e esta ser suportada pelos mais frágeis? Ou a impossibilidade de participar activamente na vida política do país, dado o sistema hermético em que vivemos, onde só os partidos definem quem participa e quem pode ser deputado à Assembleia da República que, por sua vez, é a única instância que pode legislar para alterar esta situação? Claro que não, e não bastasse a resistência dos partidos do sistema, contam com a preciosa ajuda da UE, na colocação de barreiras, em amedrontarem as pessoas, em criarem fantasmas e criticarem as alternativas, porque simplesmente não têm argumentos nem alternativas e só estão preocupados na manutenção dos seus lugares, dos seus privilégios, pois mesmo em tempos de austeridade, esta, como se sabe, não é igual para todos. Para quê pensar em alternativas, procurar encontrar soluções, basta colocar entraves para que os “Syrisa’s” deste mundo falhem, é mais fácil, não é preciso pensar nem provar nada, afinal sempre houve ricos e pobres, para quê pensar em algo que erradique a pobreza? É contra natura e se calhar Deus assim o quer. Então não há preocupação com os pobres? Não se criaram os Bancos Alimentares, as Ligas Contra a Fome, a Santa Casa da Misericórdia, não se atribuíu o Rendimento Social de Inserção? Enfim, é a política da caridadezinha, para a qual, sempre é mais conveniente dar, de vez em quando um pouco de peixe, do que ensinar a pescar.

E porque será que a Educação é um tema sempre presente e inacabado, cujo controlo é tão apetecível para certos extractos sociais? É que, sem formação, sem educação, se consegue manipular muito melhor o povo, pois todos sabemos que um povo culto é muito mais difícil de subjugar, porque sabe, porque conhece, porque contesta, porque questiona e é capaz de pensar e compreender e o medo com que lhes acenam não funciona.

Concluindo, será de continuar a dar o voto e a aprovação aos que nunca fizeram nada em favor do povo, aos que apenas se preocuparam em manter o “status quo”, aos de sempre que querem simplesmente defender os seus empregos e os seus privilégios? É que ser-se governante ou deputado, ao contrário do que se possa pensar, hoje já não é uma missão, passou a ser um modo de vida, um emprego e, como diz o povo, viver não custa, o que custa é saber viver.
Assim, será de continuar pela senda dos preconceitos e das ideias feitas, em vez de exigir novos políticos? Ou será de continuar a votar nestes, nos do costume, com o medo de mudar, refugiando-se no argumento de que com estes pelo menos sabemos o que nos espera. E o que nos espera, a continuidade da alternância na manutenção da ignorância do povo? Então votemos nos de sempre, para que as coisas se mantenham como sempre, mas para isso é conveniente que a Educação não avance, que continue apenas a ser, como sempre, uma paixão, senão ainda acaba por colocar em causa a lógica do medo e do papão.


sexta-feira, janeiro 23, 2015

A geopolítica do petróleo


O Orçamento do Estado português para 2015 foi elaborado considerando que o barril de petróleo se situaria, em média, nos 96,7 dólares. Na passada quarta-feira dia 21, a sua cotação situava-se nos 48,97 dólares por barril. Tal significará que o Estado português obtém assim uma folga significativa no que concerne às despesas correntes previstas pois os custos de importação desta matéria-prima registam uma redução muito significativa. Como sabemos, Portugal é um país que importa a esmagadora percentagem do petróleo que consome. Por outro lado, o país registará vantagens numa outra vertente já que esta folga aplica-se igualmente aos restantes países da Zona Euro, permitindo-lhes assim com tais folgas, obter margens orçamentais que lhes permitirá absorver mais importações uma vez que é esperado um aumento do consumo interno em países muito importantes para as exportações nacionais como são o caso da Espanha, Alemanha ou França. Se juntarmos a isto a desvalorização do euro face ao dólar americano, estão reunidos um conjunto de ingredientes para que o ano de 2015, e quem sabe de 2016, sejam anos favoráveis a uma retoma do crescimento económico. Isto quando se sabe que o país quer firmemente apostar de forma significativa no aumento das exportações e nas empresas exportadoras. Qualquer exportação para mercados fora da Zona Euro representará, por isso, uma vantagem competitiva.
Aliás, recente estudo realizado pela Universidade Católica apontava para uma previsão mais favorável do que o esperado no crescimento económico para 2015. Contra uma previsão de crescimento do PIB nacional de 1,3% por parte da Comissão Europeia e de 1,5% do governo português, a Universidade Católica prevê um crescimento do PIB muito perto da casa dos 2% já para este ano o que ajudará a acentuar a queda do desemprego para valores que se estima atinjam os 13,1% no ano que vem.
A estimativa mais corrente entre os analistas económicos e os economistas em geral é que o barril de petróleo se situe este ano, em média, nos 50 dólares. No entanto os países da OPEP, através do seu secretário-geral, contrariam estas previsões e afirmam que não é esperado que o barril de petróleo venha a atingir os 20 ou 25 dólares. Estimam antes que o valor do barril manter-se-á nos níveis atuais para depois subir para perto dos valores registados anteriormente. Naturalmente que quem tem peso aqui é a Arábia Saudita já que a Venezuela, Angola ou o Irão estão à beira de uma crise financeira por falta de receitas que afeta a sua capacidade de adquirir bens ao exterior o que se traduz em falta de divisas externas que lhes provoca fortes tensões inflacionistas.

Mas a Arábia Saudita consegue lidar bem com este quadro. Os especialistas e analistas que acompanham o setor do petróleo afirmam que este país suporta os valores atuais de forma diferente dos seus pares porque, tendo em conta os seus custos de extração e abundância, o país já tem margem de lucro com um preço do barril que se situe no intervalo entre os 10 e os 20 USD.

Muito se tem discutido e especulado quanto ao impacto que esta queda do preço do petróleo terá na economia portuguesa. Pelas informações obtidas junto de quem teve acesso a estudos sobre esta matéria, aparentemente uma quebra de 10 dólares no barril de petróleo representará uma folga orçamental para Portugal na ordem dos 700 milhões de Euros. É muito significativo. Por outro lado, cálculos sobre esta matéria apontam para um outro tipo de resultados sobre os quais merece a pena refletir: nos preços atuais e com os ganhos produzidos, a diferença entre as exportações nacionais e as importações nacionais representam um ganho de 6 mil milhões de Euros, favoráveis à balança comercial do país. Além disto iremos poupar todos na fatura energética: as empresas, o Estado e as famílias.

Esta discussão tem surgido pelo peso e importância que Angola representa no contexto das exportações portugueses e da importância deste mercado para as empresas nacionais. Nada mais verdadeiro.

É um facto que Angola se ressente com este preço do petróleo já que a atividade económica desta matéria-prima representa 40% do PIB, 75% das receitas do Estado e 95% das exportações. Com um orçamento para 2015 considerando um preço por barril de 81 USD, aguarda-se por um orçamento retificativo já no início de fevereiro para o qual, tem sido veiculado pela imprensa, o governo angolano estipulará um preço por barril de 40 USD. Aguardemos para saber.

Angola é já o 5.º mercado de destino das exportações nacionais e o volume das exportações para este país representam cerca de 3 mil milhões de Euros em produtos e/ou mercadorias ao que se soma cerca de 1,5 mil milhões de euros em serviços (são cerca de 6,6% do total do valor exportado) já acima portanto dos EUA. 

Estarão a residir permanentemente em Angola cerca de 250 mil portugueses mais alguns 30 ou 40 milhares que lá trabalham sem vistos de trabalho e que lá permanecem intermitentemente. Estão registadas como exportadoras 9000 empresas com 2000 empresas em Angola detidas por capital nacional.

Independentemente deste cenário, pelos estudos efetuados e pelos valores percebidos, o valor atual do petróleo em termos internacionais é favorável à economia nacional. Estima-se assim que o corrente ano e o próximo possam trazer, se não o verão, pelo menos a primavera à economia portuguesa.

quinta-feira, janeiro 22, 2015

Um Serviço Nacional de Saúde para o século XXI


O SNS tem sido reconhecido não só pela generalidade dos profissionais de saúde mas também por uma larga franja de cidadãos, como um bom sistema e uma das «construções« mais sólidas do período da democracia. Há mesmo quem lhe aponte muitos sinais e exemplos de excelência.

Muito foi feito e investido no SNS ao longo dos anos e muitas das ineficiências foram sendo, também ao longo dos anos, combatidas. Todos temos bons e maus exemplos mas na generalidade, muitos especialistas, estudiosos do tema e profissionais da área que não apenas médicos, testemunharam a sua qualidade comparativa.

Surpreende por isso muitos cidadãos o que se tem passado recentemente nas urgências dos hospitais neste período festivo de Natal e fim de ano. Na opinião de muitos, parece que o colapso se instalou e que os casos dos óbitos ocorridos, ultrapassam o que era esperado e expectável em face de toda a evolução e da qualidade já reconhecida ao SNS.
No hospital Amadora-Sintra, chegou-se ao ponto de um doente ter que esperar em média 22 horas nas urgências para ser atendido. Tal situação, levou à necessidade de contratar de uma só vez 10 médicos para o serviço de urgências. Depois, observando-se o cenário a nível nacional, verificou-se que no Porto esse período de espera foi em média de 18 horas, no centro do país de 10 horas e nos hospitais públicos do sul de cerca de 20 horas. Estas ocorrências foram totalmente inesperadas e levaram à exigência de explicações por parte do governo e alertaram para a necessidade de uma profunda reflexão sobre o que se passa na saúde.

Notícias da primeira semana do ano davam conta que os hospitais de Almada e do Barreiro apresentaram médias de 24 horas de espera nas urgências e que por exemplo o hospital de Abrantes já nem daria respostas quanto ao tempo de espera estimado.

Ouvindo o que os representantes dos enfermeiros e o bastonário da Ordem dos Médicos afirmam, a culpa é da má gestão nas áreas da saúde, da racionalização de meios imposta e da redução dos custos de funcionamento, onde se incluirá  a insuficiente contratação de médicos e/ou o aumento do nº de horas de banco/urgência, imposto pelo governo, o que reduziu estruturas e contribuiu para instalar o caos nas urgências. Haverá médicos e enfermeiros que estão 48 horas em permanência de serviço. Tal não se trata, por isso, de um cenário aceitável e compatível com um país desenvolvido e o que se espera de um SNS como aquele em que o país vinha há muitos anos a investir.

Este cenário em que se vive no momento, tem resultado, segundo várias opiniões provenientes de diversos quadrantes ligados à saúde, da ausência de planeamento adequado por parte do Ministério da Saúde o qual não acautelou o aumento significativo do fluxo de doentes aos hospitais nesta quadra e neste período de Inverno.

A posição tornada pública pela Ordem dos Médicos, Ordem dos Enfermeiros e profissionais da administração hospitalar é que as causas desta situação radicam no mau planeamento o que, a acrescer aos cortes nas verbas da saúde e ao nível mínimo de pessoal em que muitos hospitais operam, muitos deles sem margem de segurança que permita acautelar aumentos da procura, levou à falta de capacidade de resposta das unidades hospitalares.   
Acresce ainda um outro facto curioso: o de os Bombeiros virem a afirmar que as macas chegaram a estar esgotadas e o nº de ambulâncias foi insuficiente para, em determinados períodos, dar resposta às necessidades dos pacientes, situação que não é aliás nova e que já se tinha repetido.

Do lado do governo surgiu a informação, que parece óbvia, de que não é possível adivinhar nem as condições climatéricas que se têm feito sentir neste Inverno, nem o tipo de estirpes da gripe que todos os anos sofrem mutações, fatores associados ao aumento do nº de óbitos nesta época do ano, o que torna difícil uma resposta adequada aos problemas surgidos. Aliado a estes factos está, defende o governo, um outro: a passagem à reforma, no ano transato, de 600 médicos do SNS.

Já a Ordem dos Médicos aponta também a emigração como agravante deste cenário já que é referida a saída para o estrangeiro em 2014 de cerca de 400 especialistas, não porque não fossem necessários, não porque não obtivessem colocação mas sim porque as condições remuneratórias propostas lhes eram muito adversas. A mesma refere também que o problema é ainda agravado porque uma má gestão da saúde permitiu que se deixassem sair estes médicos o que depois levou à necessidade de contratar empresas fornecedoras de mão-de-obra aos hospitais, porém já tarde.

O que se sabe é que no último mês se registou o óbito de 8 pacientes nos serviços de urgência dos hospitais públicos. A Direção Geral de Saúde (DGS) afirma que ocorreram mais 1.900 óbitos para além do esperado nesta época do ano. Entretanto o governo coloca como hipótese vir a contratar médicos reformados para o Centro Hospitalar de Lisboa e voltou a disponibilizar mais 562 camas no serviço público.

Tudo isto exige uma profunda reflexão e debate sobre o que se está a passar no setor da saúde em Portugal. As medidas tomadas ou a tomar, como atrás referido, podem induzir os cidadãos a pensar que nem tudo foi adequadamente planeado e organizado e que os serviços públicos de saúde entraram em rotura por causa disso.

Pelas informações veiculadas na comunicação social e através dos representantes das organizações do setor da saúde, percebe-se mal se há efetivamente falta de médicos; aparentemente parece que sim. No entanto há médicos a ser contratados pontualmente através de empresas prestadoras de serviços afirmando a Ordem dos Médicos que são pagos 8€ por hora nos hospitais públicos quando nos privados lhes são pagos 80€.
Outro aspeto que se entende mal é o acesso à profissão. Em Portugal exige-se os 18 valores como média mínima para o acesso aos cursos de medicina o que limita de forma drástica a preparação de novos médicos. Mas não será a profissão de médico acima de tudo (e sobretudo) uma vocação?

Mereceria a pena uma reflexão sobre a adoção de algumas práticas existentes noutros países, como por exemplo a França (e em algumas universidades na Inglaterra) onde quem quiser e pensar que tem gosto e vocação, entra para medicina. Só depois, no primeiro ano de curso, é feita uma verdadeira seleção segundo critérios de aptidão, notas escolares, sensibilidade, conhecimentos, adaptação, vocação etc.

A restrição em Portugal à entrada de mais alunos leva a que, mais tarde, os mesmos exijam trabalhar nos centros urbanos em vez de no interior e a exigir níveis salariais que o país não consegue pagar.

Importa assim evitar o risco de ver desconstruído e fragilizado o SNS tal como foi concebido e com os méritos que muitos lhe reconhecem. Não se trata apenas e só de um problema de dinheiro. É por isso importante que se escutem os profissionais da saúde: médicos, enfermeiros, gestores hospitalares e outros.