Fórum de Reflexão Económica e Social

«Se não interviermos e desistirmos, falhamos»

quinta-feira, julho 31, 2014

BES: a regulação volta a falhar...


O Banco Espírito Santo (BES) registou nos primeiros seis meses deste ano um prejuízo de 3600 milhões de euros. Parece que tem capitais – a tal almofada – de 2100 milhões de euros. Ficam a descoberto 1500 milhões. O banco vai ter de sofrer nova injeção de capital. Os prejuízos, os maiores de sempre de uma empresa portuguesa, foram devidos à atividade corrente do banco mas sobretudo à sua exposição ao universo de empresas da família Espírito Santo, a irregularidades e veremos se a desvios ou outros crimes. Na raiz dos problemas parece estar a confusão entre banco da família e empresas da família.

É bem certo que aquela almofada que hoje permite acomodar o grosso dos prejuízos foi exigida pelo Banco de Portugal (BdP) que forçou o banco a sucessivos provisionamentos. Mas isso não o exime às responsabilidades, idem com a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), de um colapso desta magnitude. Os factos não são «supervenientes», já lá estavam. O BdP não foi competente para avaliar ou as regras ainda não são suficientemente apertadas. A continuar o atual modelo nunca o serão.

Há, pois, uma conclusão clara a extrair do caso BES. A regulação voltou a falhar. Já havia falhado no caso BPN, no caso BPP e nos casos dos restantes bancos ajudados. Apesar disto e apesar do endurecimento da supervisão, voltou a falhar. 

O que, no caso dos bancos, vem provar que:
  1. Os bancos devem ser entidades que recebem capital de quem o tem e o emprestam a quem dele precisa; o seu lucro é o diferencial; 
  2. Os bancos devem ser equidistantes das empresas, de todas as empresas; não devem deter participações em empresas, nem ser detidos por empresas; 
  3. Bancos de retalho não devem ser bancos de investimento; aliás os bancos de investimento deveriam chamar-se outra coisa qualquer, sociedades gestoras de fortunas ou similares; a designação de banco deveria estar reservada a quem compra e vende dinheiro.
É irrealista o que digo acima? Não é, porque a situação já foi assim.

As semelhanças com o caso BPN são evidentes. Muda apenas a geometria: BPN: um banco inviável/empresas viáveis (universo SLN); BES, um banco viável/empresas inviáveis (grupo BES). Não fora esta subtil mudança e a incompetência dos reguladores (BdP e CMVM) e do quadro regulatório seriam ainda maiores e os prejuízos novamente nacionalizados.

terça-feira, julho 08, 2014

Por uma verdadeira Reforma do Estado – Saúde, Fiscalidade e Mar


Na sequência das reflexões já iniciadas quanto aos processos que terão necessariamente que ser iniciados e adotados para uma verdadeira reforma do Estado, importa destacar algumas ideias que ajudem a trazer luz e clarividência a este desiderato. Num país cujo peso do Estado é o que é, qualquer reforma terá que ser avaliada tendo em vista essencialmente três pontos: 
i) a simplificação
ii) a redução do peso do Estado na vida social e económica
iii) a racionalização de meios e recursos.

Saúde

Dito isto façamos uma avaliação de uma componente da saúde que não mexe com milhares de milhões de Euros mas apenas com uma racionalização de meios e recursos. O nº de médicos do país.É sabido pelos cidadãos e veiculado pelas notícias em jornais e televisões que o país denota uma escassez na oferta de médicos em geral e de clínicos de medicina interna em particular. Diariamente circulam reportagens jornalísticas e televisivas bem como informações provenientes dos cidadãos referindo-se à falta de médicos em serviços de saúde, especialmente na região norte e em hospitais na região sul. No entanto, o acesso às universidades para os cursos de medicina é vedado a muitos estudantes atenta a média que lhes é exigida, acima dos 18 valores. Não valerá a pena recordar aqui, de novo, aquilo que é a impressão e a opinião dos cidadãos, dos pais, dos professores e de mesmo alguns médicos, segundo a qual melhores notas não significam necessariamente as melhores competências para o exercício da profissão. Naturalmente que o lobby médico sempre exerceu no país uma enorme pressão sobre os decisores da saúde e os jogos de interesses sempre superaram (ou interpuseram-se entre) as decisões racionais, mediante tomadas de posição visionando no final e afinal o seu proveito próprio, defendendo e lutando por um corporativismo atávico e um elitismo pouco coerente e aceitável num país moderno e desenvolvido.Deste modo, uma primeira decisão que enfrentaria e confrontaria este corporativismo retrógrado, seria o alargamento do numerus clausulus o que traria naturalmente as médias de entrada nos cursos de medicina para níveis mais aceitáveis e alcançável por um maior nº de alunos igualmente com aptidões e competências pessoais para virem a exercer as profissões da saúde. Há instituições, meios, espaço e condições para acomodar mais alunos e resolver assim a falta de médicos que assola e assolará ainda mais o país no futuro. Lembremo-nos de que uma população envelhecida carece de mais cuidados de saúde.   

Fiscalidade

Somos uma população envelhecida, temos muitos e cada vez mais idosos e é um facto que o país revela uma pirâmide etária invertida e envelhecida. A demografia é um dos grandes problemas das próximas décadas em Portugal e uma bomba relógio que mais cedo do que tarde trará problemas graves à sustentabilidade da segurança social e ao tão propalado estado social. Sabe-se que a taxa de natalidade tem vindo a decrescer nos últimos anos e que o cenário está longe de mostrar sinais de inversão. Sabe-se também que as famílias mais jovens têm manifestado as suas opiniões e demonstrado que parte significativa do problema resulta essencialmente de três fatores: i) a falta de condições financeiras e económicas para ter filhos (ou mais filhos), ii) a ausência de estabilidade e segurança no emprego e iii) o seu projeto de vida é hoje diferente e ter filhos não é uma prioridade antes dos 30 ou 35 anos.
Ainda assim, um recente inquérito referia que uma grande franja de jovens pais e de famílias em idade de procriação, desejavam mas não podiam ter mais do que um filho.  Perante este cenário o que têm feito os governos? Nada, antes pelo contrário, têm dificultado ainda mais esta tarefa. As famílias numerosas ou com mais filhos, em vez de serem beneficiadas por um sistema fiscal que lhes seja favorável e amigo de uma forte natalidade, pune antes aqueles que apresentam uma prole mais extensa. Dito de outra forma, os governos têm penalizado a demografia e a natalidade andando em contraciclo às exigências de uma pirâmide invertida e envelhecida. Em vez de um sistema fiscal que abrandaria a sua pressão consoante o nº de filhos de cada família, aligeirando a carga fiscal dos pais e introduzindo gradualmente determinados benefícios de espécie vária em função do nº de filhos do casal, verificamos que o quadro vigente é antes penalizador. Mais filhos não representa hoje menor peso fiscal, em certos cenários representa em termos relativos o inverso. Esta seria mais uma simples e singela reforma que seria facilmente introduzida, sem necessidade de grande ruído e mudanças estruturais.

Turismo e Mar

Os dados mais recentes da Pordata dão-nos conta de que o número de hóspedes estrangeiros alojados em estabelecimentos hoteleiros cresceu 38,9% entre 2002 e 2012, ano em que 7,7 milhões de turistas residentes noutros países pernoitaram em Portugal. Da mesma informação se retira que este crescimento foi superior ao dos portugueses em estabelecimentos hoteleiros, que aumentaram 26% entre 2002 e 2012, último ano para o qual existem dados disponíveis, de acordo com números respeitantes ao setor do turismo. Apesar de inferiores aos primeiros, estes são números muito significativos quanto ao crescimento da procura pelos serviços de hotelaria pelos cidadãos nacionais. Seguindo os números do Instituto Nacional de Estatística, no total, o número de hóspedes teve uma subida significativa nesta última década, de 31,2% para 13,8 milhões em 2012.

Os números mais recentes confirmam aliás que, em 2012, das mais de 39,6 milhões de pernoitas em estabelecimentos hoteleiros, 68,7% foram pagas por turistas vindos do estrangeiro. Não pretendendo alongar aqui a discussão em torno da importância do setor do turismo na economia nacional, o qual representa já 5,2% do PIB português, importa perceber que, do enorme potencial que este setor representa para o crescimento e progresso do país do ponto de vista económico e da projeção que pode trazer a Portugal enquanto país atlântico, muito há para fazer no que diz respeito às políticas para o turismo e para a economia do mar. Como tal, seguindo a lógica da necessidade de apresentar propostas concretas para uma reforma do Estado, capaz de o dotar de instrumentos e recursos para o tornar mais apto a lidar com os problemas do futuro da nação, eis que se abre aqui uma oportunidade para repensar a estrutura desse mesmo Estado. Desta feita, tomando em mãos a grande epopeia do turismo e do mar e a sua importância na economia nacional. E porque não estão, nem podendo estar, separados, o turismo e o mar fazem parte de um só corpo e de uma só unidade estratégica nacional. Outrora com um Ministério do Turismo e agora com um Ministério da Agricultura e do Mar, o país exige hoje a existência de uma estrutura única, focada e dedicada a um tema tão relevante para o país. De composição leve, pouco complexa mas eficaz e atenta aos problemas e em especial às oportunidades de desenvolvimento e implementação de uma política para o turismo e para a economia do mar, torna-se assim relevante a existência de um Ministério do Turismo e do Mar, aquele que, em articulação com uma diplomacia económica coerente e consistente, possa projetar Portugal quer para lá dos Pirenéus, quer para lá do Atlântico.

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