Fórum de Reflexão Económica e Social

«Se não interviermos e desistirmos, falhamos»

sábado, agosto 31, 2013

O desporto nacional tuga…

O desporto nacional dos portugueses por estes dias é «arriar» nos políticos. E fazem-no muitas vezes de uma forma generalista, tomando a parte pelo todo, implacável, e não raras vezes boçal e grosseira. É um fenómeno transversal à sociedade portuguesa. Dos reformados que recebem muito mais do que alguma vez descontaram, por via das «leis dos políticos», aos jovens recém-chegados ao mercado de trabalho depois de duas ou três décadas de estudos subsidiados pelas «leis dos políticos» e sem currículo, sem passado, sem desempenho que se conheça para o teor das críticas que fazem. Dos trabalhadores do sector privado, que recebem em «fringe benefits» privilégios e prebendas muito maiores do que as de qualquer político, pagos pelos clientes da respetivas empresas, e sem que essas alcavalas sejam devidamente taxadas, por via da falta de «leis dos políticos», aos funcionários públicos que beneficiaram de anos a fio de progressões/promoções regulares, igualmente por via das «leis dos políticos». Vê-se de tudo!

Impera a cegueira que não deixa ver o óbvio.

Vem isto a propósito de um pequeno episódio ilustrativo dessa cegueira larvar. Vinha eu de carro num final de tarde destas férias e ouvia por desfastio na rádio o início do relato do jogo de futebol entre o Estoril e o Hapoel Ramat Gun, uma equipa israelita, para acesso ao play-off da Liga Europa. Referia o repórter que ao entrar num táxi em Israel e dizendo que era português logo o motorista associou a sua nacionalidade a Cristiano Ronaldo, José Mourinho e Figo. O comentador da estação, Joaquim Rita, também comentou aquela frase referindo do alto de uma certa pose que, muitas vezes, por sentimentos mesquinhos, os portugueses não sabem reconhecer e valorizar os seus melhores lá fora. E acrescentava que se nas outras atividades o País tivesse a projeção do futebol e designadamente se tivesse políticos da envergadura de alguns dos três futebolistas mencionados Portugal não estaria como está. Logo ali meditei naquelas declarações avulsas e encontrei três nomes de políticos capazes de ombrear com aqueles outros três no futebol: Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, António Guterres, Alto Comissário da ONU para os Refugiados, e Freitas do Amaral, que foi presidente da Assembleia Geral da ONU... E concluí, como Joaquim Rita, que os portugueses, por sentimentos mesquinhos ou outros, não valorizam os seus melhores e quando são políticos, então... 

quinta-feira, agosto 29, 2013

Enfim... a Liberdade


Ainda bem que tivemos um 25 de Abril de 1974 porque no anterior regime do Estado Novo não tínhamos liberdade, quer para expressar o nosso pensamento, quer para reivindicar melhores condições de vida sob pena de sermos considerados perigosos agitadores, revolucionários, que punham em causa a estabilidade e a vida normal do país, apesar de este permanecer orgulhosamente só

Tínhamos direito a voto? Claro, mas só que o partido concorrente era o único e, mesmo no tempo da denominada primavera Marcelista, apesar de outros partidos aparecerem, rapidamente foram impedidos de ter uma voz activa. Enfim, de facto, não havia mesmo liberdade. 

Finalmente surge o 25 de Abril e, felizmente, eu estava lá, vivi e acompanhei a par e passo o Movimento das Forças Armadas (MFA), pois estava colocado no Ministério da Defesa Nacional, como se sabe, sediado na Rua da Cova da Moura, em Alcântara, uma perpendicular à Avenida Infante Santo. Ali eram controladas todas as Forças Armadas, militares, paramilitares e polícias, nomeadamente Exército, Força Aérea, Marinha, Legião Portuguesa, Mocidade Portuguesa, DGS, PSP, GNR, entre outras. 

Ali cumpri parte (cerca de 22) dos meus 40 meses de Serviço Militar Obrigatório e ali se instalou o Movimento das Forças Armadas, vulgo MFA. Tive, pois, o privilégio de assistir à chegada de Mário Soares, de Álvaro Cunhal, e de outros ex-presos políticos que ali acorreram a saudar o MFA e a se regozijarem com a chegada da liberdade que nos iria permitir introduzir a democracia para que, finalmente, o povo tivesse direito ao voto e a escolher os seus governantes, participando assim activamente nas decisões do seu país e ter acesso a uma vida melhor, através de uma distribuição mais equitativa da riqueza gerada por todos nós. 

Comemorou-se o primeiro 1.º de Maio em liberdade que só quem o viveu pode aquilatar da sua grandiosidade. Aconteceram vários episódios, uns mais outros menos felizes, próprios do período revolucionário em curso (PREC), e gradualmente se foi cimentando uma certa estabilidade social que finalmente nos deu a conhecer eleições livres, e a possibilidade de escolha dos nossos representantes para a Assembleia da República (AR) e do Governo. 

Foram tantas as promessas, os desejos, os sonhos, os anseios, feitos pelos novos políticos oriundos do exílio e da clandestinidade mas sem experiência na condução da res publica que, apesar de se esforçarem para adquirir competências, nem tudo corria bem, o que aliás era previsível. Afinal a Liberdade tinha os seus custos. 

O MFA entregou o poder aos civis, bem como os bens materiais e financeiros que confiscou ao anterior regime e que permitiram a criação de empresas públicas nacionalizadas e a constituição de novos partidos políticos. Estes novos agentes depressa se instalaram, rapidamente absorveram os bens materiais e financeiros colocados à sua disposição e se apetrecharam para o processo eleitoral, enfim, para conquistarem o poder e constituir governo. 

Passados estes anos todos o que mudou? O que obtivemos enquanto povo? Provavelmente muita coisa, entre outras a liberdade de poder escrever estas linhas sem ser preso. 

Outrora não podíamos intervir nos nossos destinos, a participação estava bloqueada pelo poder de então, as eleições existiam mas todos sabiam que eram uma fraude. E agora? Temos partidos políticos, podemos votar e escolher os melhores, os que queremos, para formar governo e nos representarem? Será que na prática temos mesmo essa liberdade? Se não concordarmos com alguém ou se verificarmos que alguém nos enganou, não cumpre o programa que nos levou à sua escolha, qual é o nosso poder? Podemos nós, cidadãos, retificar algo? Provavelmente não! E porquê? Porque, perante o actual quadro eleitoral só os deputados detêm o poder de alterar as leis e neste contexto estão, de certo modo, protegidos do descontentamento dos cidadãos que se sintam enganados, afigurando-se como uma espécie de poder absoluto, de intocáveis, como se o poder tivesse sido construído de cima para baixo, sem a participação cívica que a todos nós deve dizer respeito. Quem sabe se, mormente no início da nossa jovem democracia, facilitado pela incipiente cultura política do povo e de este ter muito que aprender, sobretudo a saber viver em liberdade, como então se dizia. Deste contexto surgiu e instalou-se um certo modelo de poder que, mantendo-se por demasiado tempo, sem ser repensado e remodelado, suscita por parte dos cidadãos ilações do tipo eles governaram-se, protegeram-se e defenderam com legislação os seus privilégios. Talvez seja o tempo de, através de uma nova lei eleitoral, se efetivar um refrescamento da nossa democracia. 

Era suposto que o papel dos lideres mais carismáticos da época fosse centrado na educação política do povo, que permitisse tirá-lo da ignorância, que lhe desse operadores para decidir a sua vida, de saber em quem votar, de saber escolher os seus representantes, mas não, nada disto foi uma preocupação, dando a entender que aqueles apenas estavam interessados em conquistar o poder, mantendo e tirando partido desta ignorância em proveito próprio. 

Assim, será lícito perguntar , mas já não era assim no Estado Novo? Enriquecimento ilícito, acumulação de cargos no aparelho de Estado com cargos nas empresas públicas, com sociedade em gabinetes de advogados e outras profissões liberais, com negócios em que ora estão de um lado ora estão do outro? Não se afigurará tudo isto muito confuso aos olhos dos cidadãos? 

Dir-me-ão, mas nem todos são assim, e depois? Quem manda? Qual o nosso poder de intervenção? Quem legisla? Quem é que define quem pode concorrer à AR? Quem é que selecciona os elementos para entrarem no partido? Quem controla os partidos? 

Parece que, em termos práticos, estamos perante um modelo fechado, constituído por partidos que não são mais do que guetos, sociedades herméticas, com normas e valores próprios quais barreiras defensivas que os protegem e lhes permitem perpetuar algumas mordomias. 

Quando toca a sacrifícios para corrigir os erros dos políticos que nos governaram, quem é chamado a pagar as consequências? E quem é que escapa sempre à sanção? E quem é responsabilizado? E quem é retirado de funções porque errou e, em vez da respectiva sanção, é colocado em lugares dourados com salários principescos? Não, não é necessário citar nomes porque todos os conhecemos e enquanto perdurar a atual lei eleitoral, dificilmente se alterará este estado de coisas. 

Será que foi esta a democracia prometida e ansiada pelos portugueses? Afinal onde estão as vozes daqueles que acusaram o Estado Novo do nosso empobrecimento intelectual, material e cultural e nos prometeram condições de vida mais dignas? 

Para o POVO sobrou a Liberdade de dizer, mas, na prática, de nada vale porque não nos dá qualquer poder, continuamos reféns dos novos poderosos que substituiram os poderosos de outrora. 

O único protesto que nos resta é demonstrar pelo voto para quem deveria ter sido feito o 25 de Abril de 1974. Se deitarmos o voto na rua, se continuarmos a passar cheques em branco, a crer e votar naqueles que nos têm desiludido estes anos a fio, então a revolução de Abril terá sido em vão.

Foto - José Ferreira Alves

A desinformação económica e o perigo dos raciocínios errados



O FMI na sua 7.ª avaliação apresenta no seu relatório um gráfico que esconde a realidade das reduções nos salários ocorridos em 2012 em Portugal. Pelo que sabemos da imprensa, alguns jornalistas tiveram já acesso a este relatório do FMI que será em breve tornado público.

O Fundo argumenta que recebeu os dados do Governo mas não os confirmou. O Executivo reconhece que os dados não são completos. Tal gráfico ilustra que a redução de salários dos trabalhadores inscritos na Segurança Social tinha sido de apenas 7%. Mas tal gráfico não exprime a realidade uma vez que o governo vem agora confirmar que, afinal, tal redução salarial atingiu já, nos empregados do sector privado, os 27% em 2012.

Mas sabe-se também, segundo a imprensa, que o FMI vem agora defender nesta próxima visita a Portugal por conta da 8.ª avaliação, a importância de mais cortes nos salários dos trabalhadores do sector privado, suportado, segundo parece, num raciocínio muito simples: se, segundo a lei da oferta e da procura, se pode concluir que o emprego/trabalho diminui porque os salários (custo) não baixam, então a redução desse custo fará aumentar o emprego (reduzir o desemprego).

Acredita portanto o FMI que as empresas não despediriam tanto ou não iriam à falência se os custos dos salários fossem mais baixos.

Seria importante recomendar ao FMI que estudasse mais aprofundadamente a economia e a realidade empresarial nacional. O problema aqui é que os técnicos de tão elevada e mui nobre instituição aparentam não conhecer e compreender bem a realidade portuguesa.

Seria desejável que instituições como o FMI entendessem que as empresas estão a falir, ou a despedir, não porque os custos salariais são exagerados ou estão acima do razoável (muitas delas pagam salários mínimos ou abaixo de mil euros a uma franja enorme de colaboradores, em especial muitas com CAE de indústria) mas porque não vendem, dito por outras palavras, porque não têm mercado e não o têm porque as pessoas não compram dado que lhes estão a reduzir os salários.

E isto é tanto mais compreensível quanto sabemos que a criação de riqueza e a produtividade nacional dependem em cerca de 70% do mercado interno (uma vez que é sabido que as exportações são responsáveis por apenas 30% do PIB nacional).

Ora se a esmagadora maioria das empresas (acima de 80%) não são exportadoras e se a esmagadora maioria da produção nacional é gerada e é destinada ao mercado interno (70%) como poderemos explicar e concluir que reduzir salários induz mais emprego quando sabemos que: menos salários significa menor procura, menor procura significa menos vendas e menos vendas significa mais falências e consequentemente mais desemprego (para além de mais pobreza)?

segunda-feira, agosto 05, 2013

Voto ou Catarse

São tantos os nomes dos políticos, alguns deles governantes, que nesta jovem democracia têm feito o que querem e lhes apetece, com a colaboração ou o beneplácito dos deputados, perpetuando este atual sistema, provavelmente porque acreditam que amanhã poderão estar no lugar daqueles que não cabe aqui enumerar.

É por isso que falam mas não mexem na lei eleitoral, é por isso que falam mas pouco fazem contra o enriquecimento ilícito, é por isso que falam mas pouco fazem para erradicar a corrupção, pois sabem que só eles poderão alterar as leis, pelo que a impunidade se mantém intocável e não há responsabilização pelos erros, ocasionais ou propositados, com dolo para os portugueses.

Mas será que realmente o problema reside nos políticos do país? Ou estará algures entre a passividade e o comodismo dos portugueses?

É natural que nos sintamos revoltados, que critiquemos estas atitudes e tenhamos necessidade de exprimir essas emoções e sentimentos, de as exteriorizarmos para aliviar a tensão intrapsíquica. Porém, há os que o não conseguem fazer e vão acumulando tensão interior até que, como diz o povo,  o copo transbordou e chega um momento em que a explosão dessa tensão acumulada é inevitável. Contudo, nestes casos, é comum serem produzidos atos de enorme violência, situações em que se ouve afirmar a estupefação dos vizinhos ou amigos, uma vez que sempre os conheceram como alguém pacífico e tolerante.

Todavia, a maioria de nós, não é assim, vai efetuando a sua catarse, vai limpando a tensão acumulada, de uma forma mais cómoda ainda que por vezes ofensiva. E, como ainda vamos usufruindo de alguma liberdade de expressão, desde que não se ofenda publicamente os nossos governantes, podemos encontrar nesta atitude uma forma de catarse. Nos cafés, nas mensagens por correio eletrónico, nas ruas, nos transportes, no barbeiro, no futebol, etc., é comum aproveitarmos para projetar toda a nossa revolta contra aqueles que não são responsáveis pelo nosso mal-estar, pois são tão vítimas quanto nós, mas tudo é válido para despejarmos o saco e assim o podermos voltar a encher, aceitando de novo e passivamente os atos de alguns destes que se governam em vez de nos governarem.

Será por isso que não têm acontecido revoltas violentas, à semelhança de outros países menos pacientes com os seus políticos e alguns usurários?

Será que estamos a necessitar de um saco menor que não esteja roto e coloque limites aos abusos de que temos vindo a ser alvo? Ou esperaremos, passivamente, que transborde e que haja alguém que limpe os cacos, a sujidade acumulada, e se inventem ou apareçam novos políticos, diretamente responsáveis por quem os elege, com moral e ética, preferencialmente mais ecológicos e que não façam tanto lixo?

É que para tudo há um limite e parece que nos esquecemos que a fome, o desemprego, a revolta latente e o mal-estar geral estão à mão de semear e constituem, por si só, um terreno fértil para um qualquer Hitler, Mussolini, Salazar ou Franco surgir do nada. E nessa altura, os que agora não respeitam o povo, a democracia, irão chorar lágrimas de crocodilo, assumindo um papel de vítimas, esquecendo-se da sua responsabilidade, das vítimas que eles próprios fizeram e dos ventos que semearam para agora colherem a tempestade.

Mas teremos que ser passivos e ficar acomodados? Se não nos resta outra forma de protesto, de expressão da nossa indignação, que não seja a do VOTO, pergunto: mas que fariam todos estes políticos se os portugueses acordassem desta letargia e decidissem não atribuir o voto a nenhum deles? Convém referir que a maioria esmagadora dos eleitores não está inscrita em qualquer partido político e, não se revendo nestes políticos, um dia pode decidir não votar ou não atribuir o seu voto.

Antes que algum tumulto ou agitação social grave aconteça, seria benéfico que se apresentassem novos partidos, com novas pessoas, com outras ideias e valores, porque a ideia ou solução de alguém se infiltrar nos partidos e os tentar mudar por dentro não me parece ter grande futuro, basta sabermos um pouco de dinâmica de grupo para perceber que aqueles seriam expulsos do partido antes mesmo de conseguirem mudar o que quer que fosse.