Fórum de Reflexão Económica e Social

«Se não interviermos e desistirmos, falhamos»

domingo, junho 23, 2013

O Brasil que não dança o samba

De facto o Brasil é por estes dias tema de conversa e notícia em todo o planeta. Senão vejamos.

O futebol é o desporto-rei no Brasil. É a sua religião. Porém os brasileiros parece acordarem agora de uma longa letargia e voltam-se contra a sua religião. Os fenómenos de revolta pública a que o país assiste são quase inéditos e revelam um novo (e real?) quadro social e sociológico que urge acompanhar com grande atenção.

Calcula-se que, com os governos de Lula da Silva, cerca de 80 milhões de brasileiros saíram da pobreza e começaram a viver dignamente. Daí que se tenha associado o Brasil a um fenómeno de crescimento e ascensão estratosféricos que o colocaram entre os 10 países mais ricos do mundo. Mas que tipo de riqueza é esta? Não será o Brasil um flop e um risco de repetição do fenómeno Argentina nos anos 90? E os anteriormente pobres não terão passado a meros cidadãos de uma classe média empobrecida?

Afinal, contra os muitos milhares de milhões investidos nos estádios e na acomodação das comitivas da FIFA e das seleções dos países participantes, os brasileiros acordam e revoltam-se contra um fenómeno que grassa no país há gerações: a corrupção, o clientelismo, o enriquecimento ilícito. Tudo isto em nome de maior justiça económica e social. 

Dão por si a lutar por preços mais reduzidos nos transportes, na construção de estradas, de escolas, no investimento na educação e na saúde, na construção de hospitais. Afinal o fenómeno de sucesso do Brasil aparenta fragilidades gritantes e o país parece surgir como um gigante doente adormecido.

Este é um fenómeno que se sabe onde e quando começa mas não se sabe quando e como acaba. São muitos milhões de cidadãos insatisfeitos e que vivem um quadro social crítico. E depois do Mundial de 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016 o que virá? Em que estado ficará o país? Como responderá à quebra da euforia da construção?

As dezenas de manifestações em muitas cidades de todo o país apelam por uma nova forma de governação. Afinal, nem tudo vai bem no Brasil. Nem o futebol aparenta ser já rei nem o samba já basta para satisfazer o povo.

sábado, junho 22, 2013

Brasil - Sono ou Sonho?

Segundo opinião de observadores no Brasil, os brasileiros mantiveram-se acomodados ao longo destes últimos 20 anos, falando em casa, nos cafés, na rua, aceitando as dificuldades da vida de forma mais ou menos pacífica.


À espera, porém, havia um barril de pólvora vazio, que foi enchendo com a falta de condições de vida dignas, com a falta de serviços médicos, de hospitais, de escolas, e mais recentemente com as despesas megalómanas relacionadas com a construção de estádios de futebol, de diversos serviços de apoio ao Mundial de 2014, aos Jogos Olímpicos, ensaiados agora com a Taça das Confederações, enquanto o POVO vivia à míngua. Estas despesas, como habitualmente, tiveram grandes derrapagens com que alguém se governou. Tudo isto foi pólvora que foi enchendo o barril vazio, a que se acrescentou a corrupção, as negociatas dos governantes, o enriquecimento ilícito de alguns, escondendo ao Mundo o Brasil real. Faltava o rastilho e, com o seu habitual bom senso, os governantes, quais samaritanos, resolveram ateá-lo com os aumentos dos transportes públicos. O POVO despertou, então, de uma longa hibernação de cerca de 20 anos, viu esvair-se o sonho prometido e exigiu o que lhe era devido, revoltou-se contra tamanha falta de respeito, contra tamanha ganância dos que enriqueciam à sua custa e agora, qual turba em movimento, como a vão parar? Estes políticos foram longe demais, pensaram que a paciência não tinha limites, que os sacrifícios eram aceites como forma de alcançar o reino dos céus, e agora... talvez um milagre os salve, ou correm o risco de acabar como a Maria Antonieta!

Será que a austeridade lusitana desenfreada - recaindo sempre sobre os mais desprotegidos, sobre os mais frágeis, sobre o POVO Português, enquanto muitos se esquivam e continuam a enriquecer de forma ilícita, seja por via de negociatas como as PPP, os SWAP, a cidade do cinema, o Freeport, as sucatas, e o POVO leva com a recessão, o desemprego, as sobretaxas, e as dificuldades acrescidas pela incúria dos nossos gestores e governantes, para não falar dos negócios de alguns clubes de futebol que cresceram 11% em 2012 - não será também um barril a encher, faltando-lhe apenas o rastilho? 

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domingo, junho 02, 2013

É só fazer as contas… Ou como libertar Portugal da austeridade?

Segundo o jornal Expresso, de 25 de maio de 2013, citando um relatório da organização não governamental Oxfam, o dinheiro existente em paraísos fiscais no mundo é equivalente ao PIB da Zona Euro e desse dinheiro 2/3 é proveniente de empresas e de pessoas da União Europeia (UE)... Ora, se todo este dinheiro estivesse domiciliado nos países em que é gerado e se sobre ele incidisse uma taxa fiscal de 20% ou 25%, por exemplo... É, como diria Guterres, só fazer as contas...

Entretanto, José Gomes Ferreira (JGF), como habitualmente traduzindo para miúdos a linguagem económica, perguntou há dias a João Moreira Rato, Presidente da Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública - IGCP, E.P.E., porque motivo não é possível ao cidadão comum comprar dívida pública no mercado primário, ou seja, diretamente ao Estado, sem ter a banca como intermediária? 

A  pergunta de JGF é inteiramente pertinente e a evidente incomodidade do presidente do IGCP na resposta é diretamente proporcional a essa pertinência, ainda que registando, porém e apesar disso, a honestidade intelectual da resposta... Vale a pena referir que, em 2010, os depósitos dos particulares na banca nacional eram de cerca de 116mM€. A poupança doméstica - sabe-se - tem aumentado, pelo que aquele valor hoje já é superior. Vale a pena ainda referir, pondo as coisas em proporção, que a dívida pública, não em 2010, mas no final de 2013, será de cerca de 200mM€... É também, ainda como diria Guterres, só fazer as contas...

O combate denodado à evasão fiscal, designadamente aos paraísos fiscais no mundo, por parte dos países da UE seria uma forma de eliminar, ou pelo menos de mitigar fortemente, o peso da austeridade que recai sobre os povos, e a venda de dívida pública do Estado Português diretamente ao cidadão e contribuinte nacional, sobretudo ao pequeno aforrador, seria uma forma de este lhe devolver com uma mão parte do que lhe retira com a outra…

Ambas são formas concretas de libertar Portugal da austeridade, que dariam corpo à mera retórica política e de cidadania (PDF), formalmente escorreita, erudita, elegante, empolgante e mobilizadora, mas na prática vazia de soluções e de propostas que vejo por estes dias... Pena é que não veja os partidos e a sociedade civil pegar firmemente, por exemplo, nestas duas bandeiras...