Fórum de Reflexão Económica e Social

«Se não interviermos e desistirmos, falhamos»

sábado, janeiro 26, 2013

O PPR do Estado e a economia de casino


O Regime Público de Capitalização – Certificados Públicos de Reforma, o chamado PPR (Plano Poupança Reforma) do Estado, não garante o capital. Os PPR privados garantem o capital porque o Estado os obriga a garantir. Os depósitos a prazo também garantem o capital porque o Estado obriga o sistema bancário a garanti-lo. Os certificados de aforro garantem igualmente o capital porque o Estado se entende como pessoa de bem. 

Porém, esse mesmo Estado, munificente para os reformados do regime geral da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, que não descontaram para o que estão/vão receber, mostra-se curiosamente avaro em relação aos reformados ou futuros reformados do seu regime complementar de Segurança Social que descontaram cada cêntimo que tem o respetivo fundo. Entendeu, assim, unilateralmente e do alto do seu pedestal normativo, que aos cidadãos que poupam para a reforma e aderem ao seu regime não devia garantir o capital. E fê-lo não da forma aberta e transparente que exige aos outros, mas de forma encapotada, sub-reptícia, ínvia, dissimulada, porque isso não está claramente expresso na lei. Chamado a responder a isto, o Provedor, dito de Justiça, achou bem. Este caso já foi abordado aqui e aqui

Ontem, li mais isto. Mais uma vez o Estado, unilateralmente e sem perguntar aos subscritores desse regime, alterou as regras. Doravante, aquele fundo passa a ter mais risco porque passa a poder comprar por exemplo ações de bancos nacionais, independentemente do rating que tenham. Já não bastava que o fundo se tivesse encharcado de dívida pública portuguesa, que tem o rating que se sabe, agora também permite isto. O Estado, que já podia usar as poupanças dos ativos que descontam para a sua reforma para se financiar através da compra de dívida pública, agora também pode usar as poupanças dos ativos que descontam para a sua reforma para financiar os bancos. 

Vale a pena dizer, a este propósito, que grande parte dos fundos de reforma existentes no estrangeiro, mesmo para a compra de dívida pública, têm regras bastante apertadas que exigem, por exemplo, que essa dívida seja de países com um rating de triplo A. Esse facto, aliás, foi um dos que esteve na origem da depreciação do valor da dívida pública nacional que, com a baixa do rating, levou a que muitos fundos se tivessem de desfazer desses ativos e/ou não pudessem comprar mais.

Custa-me, confesso, ver o Estado a fazer isto e a comportar-se desta maneira. Quando o Estado se começa a parecer com as empresas deixamos de percecionar a diferença entre público e privado, e passamos a ter a sensação de viver numa espécie de selva em que é tudo igual e ninguém nos protege.

domingo, janeiro 20, 2013

Portugal ou Suíça?




Portugal é um país que pode reunir todas as condições para ser uma Suíça no sul da Europa. Geograficamente privilegiado, pode posicionar-se como uma porta para abastecer o mercado europeu em produtos e serviços de vanguarda e servir de plataforma de negócios, centro de serviços e logística, quer para a União Europeia quer para a Lusofonia (países da CPLP).

Portugal tem, por comparação com a Suíça, um melhor clima, uma mais longa e influente História para descobrir, uma gastronomia ímpar, uma hospitalidade e pacatez mais vincadas, igual segurança, grande beleza natural, excelente e diversificada oferta turística de serra e mar, um país de sol e praia que consegue fomentar os desportos marítimos e captar uma procura turística diversificada. Além disto apresenta uma rede de infraestruturas de qualidade. Portugal possui 8 aeroportos internacionais, 3 dos quais no Continente, 4 no arquipélago dos Açores e 1 na Madeira. De Lisboa e do Porto saem voos para as principais cidades europeias e para algumas das mais importantes do mundo. Dispõe de 9 portos de grande capacidade, tem 48 linhas férreas que cobrem o país, uma das quais considerada de alta velocidade. Tem ainda excelentes vias de comunicação rodoviárias e uma oferta significativa de excelentes e modernos parques de escritórios para empresas, com uma adequada logística de serviços e transportes. A rede de hotéis é das melhores da Europa onde se podem realizar as melhores e maiores conferências e encontros de negócios assegurando a mais elevada qualidade de serviços.

Existe em Portugal uma disponibilidade de capital humano, jovens e menos jovens licenciados, provenientes de boas universidades onde são ministrados bons cursos universitários, que permitem uma oferta de especialistas em engenharia informática, engenharia aeronáutica, em tecnologias de comunicação e informação, investigação e ciências bioquímicas, médicas e biomédicas ou em áreas económicas e empresariais.

No período compreendido entre 1991 e 2011 o país registou progressos assinaláveis ao nível da educação. Multiplicou por 1,5 o número de matriculados no ensino superior e por 4 o número de diplomados. O número de pessoas entre os 15 e os 64 anos com o ensino superior completo correspondia em 2011 a 25% da população activa. Em 2010 o país tinha lançado no mercado mais de 78 mil diplomados com um qualquer grau do ensino superior.

Em Portugal, os jovens licenciados, no quadro das grandes dificuldades macroeconómicas em que o país vive, têm energia e vontade para prosseguir uma carreira, realizarem-se profissionalmente e ter sucesso. Vestem a camisola a 100%, são eclétios, na sua maioria disponíveis para trabalhar em qualquer parte do mundo e com grande espírito competitivo. Trata-se de uma geração bem informada, alguns muito viajados, com pleno domínio das tecnologias e ferramentas de informação e comunicação, nas quais Portugal é um early adopter, e possuem grande apetência para falar línguas.

Notícias recentes atestam esta realidade: empresas alemãs recrutaram em Portugal mais de 100 engenheiros jovens e recém-licenciados, para trabalhar em empresas industriais no sector público e privado; Uma empresa de recrutamento francesa veio recrutar no país jovens médicos e enfermeiros para trabalhar quer no sector público quer privado.

Encontramos em Portugal um sistema de telecomunicações e informação dos mais desenvolvidos do mundo. O país está muito bem posicionado em termos europeus na oferta e cobertura de internet de alta velocidade, apresenta neste serviço uma boa cobertura nacional, acima dos 25%, oferece uma das mais modernas infra-estruturas de fibra óptica posicionando-se no TOP 20 dos países com maior uso desta tecnologia. Sem ser visto como um país símbolo da inovação, Portugal é efectivamente, à sua escala, um país inovador. Temos vários exemplos: o sistema pré-pago para telemóveis, que representou um caso de inovação mundial; o sistema de pagamento automático de portagens nas auto-estradas, através da chamada Via Verde; o actual sistema automático de cobrança em portagens; a liderança mundial na inovação na indústria de moldes para automóveis ou com aplicação na aeronáutica; a especialização no fabrico de componentes automóveis para algumas das principais marcas mundiais já para não falar da inovação e criação ao nível da indústria do calçado e do têxtil.

Portugal é por tudo isto um país fascinante. Tem conseguido tirar partido destas características mas está longe de optimizar os seus recursos e activos. Em virtude da crise económica e financeira que atravessa, o país necessita de captar investimento estrangeiro para fazer crescer a economia, criar riqueza e emprego. Mas está a competir com países europeus e asiáticos. Neste campo Portugal tem apresentado muitas fragilidades pois temos assistido não só a uma redução do investimento vindo de fora mas também a algum desinvestimento externo. Um dos pontos fracos deriva do sistema fiscal, complexo e desfavorável a quem quer investir, seja pelas elevadas taxas de IRC, licenças e outros custos administrativos mas sobretudo pela volatilidade das suas regras. A política fiscal é irregular e sofre mudanças contínuas em função dos Governos o que tem criado um quadro de grande incerteza e instabilidade, o que retrai os investidores. 

Neste quadro o país tem quase todas as condições para se afirmar como um destino estratégico para a localização de empresas multinacionais, designadamente ao nível dos seus serviços partilhados (shared services centres) o que lhes permitirá aproveitar todos os recursos já aqui enumerados. A prova disso é que temos já o testemunho de várias iniciativas de sucesso através dos exemplos de empresas como a Fujitsu, a Siemens, a Nokia Siemens, a Cisco Systems, o BNP Paribas, ou mesmo a Microsoft e a Solvay, que colocaram em Portugal os seus shared services centres. Aqui concentram e desenvolvem as suas atividades que vão desde os call centers à investigação, serviços centrais administrativos, informáticos ou financeiros.

Para a Lusofonia, o país pode concentrar uma plataforma de apoio logístico, legal, financeiro, administrativo, de tradução e de apoio diplomático e empresarial a todas as empresas e investidores que pretendam investir nestes países, dado que conhece como ninguém as suas características. Há ainda as oportunidades que resultam do facto de estes países necessitarem de professores e formadores, pelo que as alianças entre as Universidades e escolas seria um primeiro passo indispensável.

Portugal é um país amável, generoso, moderno e inventivo que permite às famílias dos que vêm trabalhar segurança e uma boa qualidade de vida. O país tem que melhorar os seus pontos fracos de modo a elevar a qualidade da sua oferta: um quadro fiscal estável e amigo do investidor, uma justiça célere e uma simplificação urgente da burocracia. Todos os restantes ingredientes estão cá.

Artigo publicado no semanário Vida Económica  (01-12-2012) e no diário OJE (12-12-2012)

sábado, janeiro 19, 2013

Provedor de Justiça vs Provedor da Lei



O Provedor de Justiça, que não é o Provedor da Lei, enviou recentemente para o Tribunal Constitucional um pedido de fiscalização sucessiva de várias normas do Orçamento de Estado para 2013, entre as quais a que diz respeito à contribuição extraordinária de solidariedade de reformados e aposentados.

O Provedor de Justiça, que não é o Provedor da Lei, através do seu Provedor-Adjunto, negou-me razão na queixa que fiz relativamente à contribuição para o Regime Público de Capitalização – Certificados Públicos de Reforma, o chamado PPR do Estado. Os contornos da situação foram aqui relatados.  

Sintetizando, os atuais reformados e aposentados não descontaram, nem de perto nem de longe, para o valor da pensão/aposentação que estão a receber do Estado.

Eu descontei cada cêntimo para aquele fundo que permitirá(ia) ter, na idade de reforma, direito a um complemento à minha aposentação ou a receber de uma só vez o valor dos descontos efetuados, acrescidos da valorização.

Os atuais reformados e aposentados não podem sofrer qualquer redução sobre aquilo para que não descontaram.

Eu sofri uma redução sobre aquilo que efetivamente descontei. 

O Provedor de Justiça não deve ser chamado Provedor de Justiça mas sim Provedor da Lei. E da lei na sua forma mais estrita e redutora.

A partir deste caso, a minha crença no chamado Estado de Direito, que era baixa, diminuiu, e na Justiça, que era baixíssima, é hoje menor ainda.

Diz o lema da Provedoria: «Na defesa do cidadão». Não acredito, o cidadão está sozinho.