Fórum de Reflexão Económica e Social

«Se não interviermos e desistirmos, falhamos»

segunda-feira, maio 14, 2012

Por uma Plataforma Ibérica

Realizou-se no dia 9 de Maio na cidade do Porto a XXV Cimeira Luso-Espanhola, passado que foi um interregno de 3 anos. As relações políticas, económicas e comerciais com os vizinhos espanhóis mantêm-se a um bom nível. Vejamos que, independentemente da corrente político-partidária que lidera os governos de ambos os países, as relações ao nível politico têm sido próximas, amistosas e de cooperação. Em termos comerciais, Espanha é o principal mercado destino das exportações portuguesas e também o principal mercado fornecedor de Portugal. Os dois países vivem hoje uma crise financeira, económica e de crescimento, profundas, cujo reflexo no desemprego é a maior marca a registar e onde esta crise tem o seu expoente máximo. É por isso hoje mais determinante que vingue entre os dois países um clima de diálogo de cooperação política e económica.

Daí que a Cimeira agora realizada se deveria revestir de uma importância crucial para os destinos desta Plataforma Ibérica. Para além da atenção dada à situação de crise económica e financeira em que vivem os dois países, foi dada importância a assuntos como a cooperação ao nível da energia e dos transportes, das vias de comunicação ou da segurança e defesa, ou com promessas de acordos para eliminar a dupla tributação em áreas como o gás natural, temas que dominaram esta Cimeira. É aceite por todos os responsáveis políticos e pelos analistas que acompanham a situação política e económica quer em Portugal quer em Espanha, que assuntos como o mercado ibérico de electricidade, a cooperação em termos de energias renováveis, a importância de uma política de transportes de mercadorias, em especial do transporte ferroviário, a gestão da água ou a cooperação no mercado laboral, são temas que, interessando aos espanhóis, interessam ainda mais ao lado português.

Não esqueçamos que existem ainda outras áreas que são essenciais para que a cooperação político-económica possa vingar. Tenho que dizer que sempre com maior pendor de interesse para o lado português porque o ponto fraco está do lado de cá. Refiro-me por exemplo a uma maior articulação nas áreas do turismo chamando a si um tema muito importante para os dois países, que deveria servir para desenvolver uma estratégia comum através da criação de um lema: a captação do turismo europeu para a Plataforma Ibérica.

Diria também que seria desejável que Portugal assumisse uma política fiscal mais próxima e “compatível” com o que vigora do lado espanhol. Quer na tributação das empresas quer ao nível do IVA, uma vez que esta nos deixa numa posição de grande desvantagem face aos nossos vizinhos já que será mais fácil para Espanha captar investimento estrangeiro dado o quadro fiscal mais favorável. Por outro lado este é menos penalizador para as empresas e para as famílias.

Espanha é e será por muitos anos um parceiro incontornável no futuro da economia nacional. Pela força e representatividade das trocas comerciais, pela cooperação politica, pela posição geográfica, pela proximidade e pelo que já foi construído ao longo de décadas fruto das relações politicas e económicas. Portugal continua a ser o parceiro mais fraco e mais pobre, porém a posição do país pode e deve ser elevada ao seu real grau de importância. Porque Espanha atravessa uma crise profunda cujo impacto no mercado laboral é ainda mais profundo do que em Portugal. Porque Espanha revela dificuldades em termos económicos e orçamentais num quadro de recessão económica. Porque integrados numa Plataforma Ibérica, os dois países podem falar mais alto, mais forte e ir mais longe na defesa dos seus interesses. Não em rotura com a Europa mas solicitando aos decisores europeus as soluções e medidas mais adequadas aos seus problemas.

É certo que Espanha é um país divido por 13 autonomias regionais que pensam e actual diferente. Que se culpabilizam entre si ou que não assumem de forma cooperante as responsabilidades pela situação económica do país. E essas autonomias criam obstáculos e dificuldades a uma maior e melhor integração económica com Portugal.

Ainda assim, atentos os problemas comuns vividos nesta Plataforma Ibérica, até que ponto seria desejável que Portugal e Espanha se apresentassem à UE e a Bruxelas com um sentido de união e como bloco económico de modo a renegociar para a Plataforma Ibérica, condições financeiras menos agressivas, outras metas ou um outro calendário para cumprir os seus objectivos em termos de política orçamental?
Não teriam, Portugal e Espanha, a ganhar com esta estratégia de força e união, na negociação com Bruxelas? Não teriam um outro peso no contexto europeu?

Naturalmente que teria que haver lugar à contemplação das diferenças que os separam e às especificidades e problemas intrínsecos de cada país. Mas na essência, não teriam ambos uma força que hoje, separados, não têm?

O repto que lanço é desafiar ambos os governos a analisar e a avaliar este posicionamento.

É que, dado o encaixe geográfico, as fortes relações e integração comercial, os problemas orçamentais e a recessão vivida em ambos os países, não seria mais fácil negociar para a Plataforma Ibérica, um pacote que se ajustasse ao bloco em si, que por sua vez permitisse os devidos ajustamentos a cada país? Talvez valha a pena pensar nisto.

quarta-feira, maio 09, 2012

Ecos de uma Europa em estilhaços




Temos vindo a assistir gradualmente ao estilhaçar do modelo sócio económico europeu. A grave crise, primeiramente financeira, depois económica e agora social, veio pôr à prova a solidez da Europa a qual não está a saber (nem a conseguir) resistir ao teste, infelizmente real, não simulado, da situação de pressão económica e social em que vivem as empresas, as famílias e as nações europeias.

E a Europa não resiste demonstrando uma desorientação e uma desunião como provavelmente nunca se assistiu antes, desde a sua fundação. E o que tem estilhaçado o modelo sócio económico europeu não foi uma guerra, uma catástrofe natural, um confronto político entre Estados ou uma desavença entre blocos comerciais. Foi primeiro a crise, mas mais e pior do que esta, foi a austeridade resultante da crise. Podemos acreditar que os povos entendem até certo ponto e em certa escala, as medidas de austeridade que lhes são impostas pois é certo que as pessoas têm a noção das dificuldades financeiras porque passam os orçamentos nacionais, os custos da dívida, os problemas dos bancos e de algumas instituições públicas. De um modo geral, todos os países europeus têm passado por problemas idênticos assistindo-se a ecos de revolta e de insatisfação por todo o lado. Porém, os povos não entendem a profundidade, a braveza e a dureza desta austeridade. Em primeiro lugar porque esta não lhes está a ser explicada, por outro lado porque não se percebe quando terminará nem quais os benefícios futuros que tiraremos todos deste sufoco e das dificuldades, em muitos casos graves, porque passam as pessoas. E com isto assistimos a uma Europa desnorteada, em que cada país fala por si e para si, subjugados a uma austeridade com correntes internas em que uns concordam e outros discordam, mas que tornam a Europa, como um bloco, refém.

No plano meramente teórico e das ideias, circula pela Europa entre as organizações da esquerda e de um certo centro-esquerda uma corrente menos favorável a uma austeridade com a dureza da que vivemos e defensora da teoria da política do crescimento económico como alavanca para uma maior competitividade, como contraposição a esta austeridade e como instrumento para evitar a dureza em que vivemos. Já as organizações de direita se têm afirmado mais defensoras de uma política de forte austeridade como alavanca para um futuro crescimento económico sustentado. Porém, as quebras no consumo interno e os níveis de desemprego, pelo menos no plano interno, têm sido fortes opositores deste desiderato.

De uma forma ou e outra, julgamos que o caminho da austeridade pura e dura, brava e persistente não conduzirá o país nem a Europa ao seu melhor destino. As pessoas sentem que esta é demasiada, cruel e desumana, dadas as dificuldades, problemas e amarguras que tem produzido na vida das pessoas. Por isso as pessoas se têm manifestado contra esta nova forma de ser Europa. Uma Europa que passa com grande velocidade da primazia de um modelo social, de bem-estar e de prosperidade para um modelo de seguidismo, de subjugação e de subserviência aos mercados. Um modelo que responde com essa mesma austeridade às pressões e aos apertos desses mercados perdendo toda a sua génese e ADN construído ao longo de décadas.

E estas são as razões para que tenhamos assistido à condenação dessa mesma Europa e ao modelo agora seguido. Foi contra esta actual Europa e por uma nova Europa que o governo caiu na Islândia, na Irlanda, que mudaram as forças políticas na Espanha, na França, na Grécia e em Portugal. Porque sendo entendida a necessidade uma certa corrente de austeridade, a força dessa corrente e o tempo que é dado aos países para se ajustarem a esta nova realidade e equilibrarem os seus orçamentos, é curto, demasiado curto, provocando um desgaste social e emocional nas famílias de tal forma que as pessoas exigem a mudança. Como têm afirmado algumas vozes discordantes deste modelo de Europa, tudo isto torna ilegítimos todos os esforços exigidos às pessoas e põe até em causa o modelo de democracia que vigora na Europa, por isso encontramos uma Europa aos cacos, em manta de retalhos, onde cada país parece navegar ao sabor do vento que lhe parece mais favorável.

É indispensável vivermos em austeridade, no caso nacional não há alternativas credíveis, sem a qual não conseguiremos provar a confiança de que somos merecedores nem resolver os graves problemas financeiros que assolam o país, cuja dívida e os desequilíbrios orçamentais não nos deixam alternativas. O mesmo se passa por quase todos os países europeus. Porém, há que saber dosear esta austeridade sob pena de matar o doente com a medicação.

Não se constroem cidades em 3 anos, muito menos países, quanto mais novos paradigmas económicos.